Blogue

Covid-19 e doença do trabalho: saiba como proteger os seus direitos

Texto de autoria do advogado Rivera Vieira (OAB/SC 41213-A).

Enquanto diversos países já colhem os frutos da vacinação em massa e contabilizam cada vez menos casos de Covid-19 e começam a liberar sua população para a retomada da convivência social sem restrições, no Brasil a situação permanece caótica, são mais de 500.000 mortos, milhões de doentes e sequelados; o registro de casos aumenta diariamente e é provável que ainda enfrentaremos mais uma onda de contágio.

As condições de proteção para a população são desiguais. Enquanto alguns conseguem trabalhar na segurança de suas casas, outros são expostos ao transporte público, ambientes com grande circulação e permanência de pessoas, e muitos são privados de itens básicos de proteção por deliberada omissão dos empregadores. Cabe aqui destacar os trabalhadores da área da saúde, que atuam diretamente expostos ao vírus enquanto atendem a população.

Essa situação de exposição ao vírus e consequente adoecimento no exercício do trabalho traz a necessidade de investigação sobre o nexo causal entre a doença e o trabalho, que é desenvolvido sob comando e responsabilidade do empregador.

É necessário alertar os trabalhadores sobre os direitos que existem para amenizar ou compensar as perdas materiais e morais decorrentes da doença adquirida no trabalho ou em decorrência do trabalho.

A técnica médica reconhece como se dá a contaminação pelo vírus, e todos sabemos que locais onde há presença de pessoas contaminadas, com grande circulação de pessoas, onde não há condições de proteção efetivas que o risco de contaminação é aumentado, sendo provável que o trabalhador que seja exposto a tais condições adoeça em função do trabalho.

Além dos trabalhadores da área da saúde, que figuram como aqueles com maior registro de acometimento da covid-19 também os empregados de hotéis, escolas, agência bancárias, transporte coletivo, supermercados, farmácias, comércio em geral, prestadores de serviços como cabeleireiros, entre outros que têm contato direto com o cliente ou laboram em locais onde há circulação e permanência de pessoas, em especial, onde não exista controle efetivo do uso de máscara, álcool gel, ou que medidas de segurança sejam relativizadas, é possível afirmar que há aumento concreto do risco de contaminação e probabilidade aumentada de acometimento.

A legislação¹ define como doença do trabalho, entre outras, a doença endêmica adquirida se comprovado “que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho”. Igualmente, determina o reconhecimento do nexo causal quando a doença é “adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente”.

No mesmo sentido, a lei 14.128/2021 garante indenização no valor de R$ 50.000,00 paga pela União (sem prejuízo de outras indenizações devidas) aos trabalhadores da saúde incapacitados permanentemente ou aos dependentes daqueles que faleceram em decorrência da covid-19. A norma estabelece a presunção da relação causal entre o trabalho e a doença (seus efeitos danosos). Segundo a lei 14.128/21, basta a prova da doença para aqueles que sabidamente atuam em condições de risco de contaminação.

Importa destacar o rol de beneficiados pela Lei e as condições para presunção:

(...)

I - profissional ou trabalhador de saúde:

a) aqueles cujas profissões, de nível superior, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de Saúde, além de fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais e profissionais que trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;

b) aqueles cujas profissões, de nível técnico ou auxiliar, são vinculadas às áreas de saúde, incluindo os profissionais que trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;

c) os agentes comunitários de saúde e de combate a endemias;

d) aqueles que, mesmo não exercendo atividades-fim nas áreas de saúde, auxiliam ou prestam serviço de apoio presencialmente nos estabelecimentos de saúde para a consecução daquelas atividades, no desempenho de atribuições em serviços administrativos, de copa, de lavanderia, de limpeza, de segurança e de condução de ambulâncias, entre outros, além dos trabalhadores dos necrotérios e dos coveiros; e

e) aqueles cujas profissões, de nível superior, médio e fundamental, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de Assistência Social, que atuam no Sistema Único de Assistência Social;

(...)

§ 1º Presume-se a Covid-19 como causa da incapacidade permanente para o trabalho ou óbito, mesmo que não tenha sido a causa única, principal ou imediata, desde que mantido o nexo temporal entre a data de início da doença e a ocorrência da incapacidade permanente para o trabalho ou óbito, se houver:

I - diagnóstico de Covid-19 comprovado mediante laudos de exames laboratoriais; ou

II - laudo médico que ateste quadro clínico compatível com a Covid-19.

§ 2º A presença de comorbidades não afasta o direito ao recebimento da compensação financeira de que trata esta Lei.

Portanto, há amparo legal para a afirmação de que há o nexo causal entre o adoecimento por covid-19 e o trabalho, mesmo em caso de pandemia, como a covid-19.

Do mesmo modo, é possível comprovar o agravamento culposo das condições de risco para o adoecimento, por exemplo, em locais de trabalho em que o empregador, responsável pelas condições de segurança do trabalho, se omite em promover a necessária adequação do ambiente de trabalho para reduzir o risco, ou mesmo negligencia no uso de máscaras e demais medidas de proteção e higiene.

Há critérios objetivos para identificação de circunstância de agravamento do risco inerente à atividade, nos quais o nexo causal entre adoecimento e o trabalho existirá se provada a omissão na adoção de medidas necessárias para redução dos riscos.

Nesses casos, deve ser assegurado ao trabalhador o registro do nexo causal (da natureza acidentária da doença) com emissão da CAT (comunicação de acidente do trabalho), do benefício previdenciário acidentário e as demais garantias legais, previdenciárias, trabalhistas e cíveis, dispensa de carência para gozo de benefício por incapacidade, depósitos de FGTS no período de afastamento, além de indenizações pelos danos materiais e morais decorrentes da doença e afastamento do trabalho.

É direito fundamental do trabalhador, insculpido no art. 7, XXII da Constituição da República a proteção à saúde e ambiente seguro para execução do trabalho, bem como é obrigação do Estado e dos empregadores a adoção de medidas eficazes para garantia deste direito, visando sobretudo a proteção da vida do trabalhador.

O trabalhador que adoeceu por covid-19 pode procurar seu sindicato ou advogado de confiança e buscar amparo para ter reconhecida, se for o caso, a natureza laboral da doença e postular, caso não tenham sido entregues pelo empregador, os direitos e benefícios previstos em lei.

____

¹ Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:

a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.

____

Atualização: Confira a entrevista concedida dia 8 de julho pelo advogado Rivera Vieira ao jornalista Gilberto Del'Pozzo, da TV Floripa.

Alguma dúvida sobre seus direitos?

Entre em contato